quinta-feira, 20 de março de 2014

Um cara estranho

Não tem um dia em que eu não me depare com algum dependente químico na "ativa" pelas ruas dessa cidade.

É triste a sensação de impotência perante algumas situações tão humilhantes às quais  esses nossos irmãozinhos se dispõem. 

Dói pensar que essa doença do "ainda", se não for por mim levada a sério a todo instante, pode facilmente me subjugar a tais situações. Me expor às ruas, à imploração de trocados no farol, às histórias tristes sobre um fantasioso filho doente em casa que precisa de um remédio caro, aos furtos, às roupas judiadas e mal cheirosas, ao desprezo da sociedade que simplesmente fecha os olhos pra esses "caras estranhos".

Cada vez que avisto um irmão desses, agradeço a Deus por
estar limpo e ainda ter a chance de retomar minha vida, pois
sei que na "ativa" eu não sirvo pra nada. Retornam as mentiras, a negação, a compulsão incontrolável, as brigas,
as noites sem dormir, os dias sem me alimentar, a culpa, o medo, a depressão e toda a falta de amor-próprio.


Ontem, numa avenida do centro da cidade, um desses irmãos abordou uma senhora que estava dentro do seu carro parado. Eu estava saindo de um consultório com minha esposa e me atentei ao diálogo deles:

- Senhora, não precisa fechar o vidro não, meu interesse não é lhe fazer mal. Só queria uns trocados.
- Não tem nada, não, moço! 
- Senhora, eu só queria um trocado pra comprar algo pra comer, eu estou nessa situação, mas eu sou boa gente. E, além do mais, eu também estou ajudando a senhora, que ao meu ver também é boa gente e está tendo a chance de provar isso.

A mulher fez um movimento de quem alcançou algumas moedas no console do carro, esticou a mão pelo vidro semiaberto e entregou algumas moedas ao rapaz que, antes de
sair, agradeceu o ato e pediu a Deus que a abençoasse.

Naquele momento, aquele cara estranho e maltrapilho fez com que aquela senhora e eu repensássemos nossas atitudes.

Será que eu estou fazendo tudo o que posso para ajudar o próximo? Ou ando desviando os olhos e fechando vidros por aí? Será que eu não quero pensar no fato que o que me separa dele é o comprimento do meu braço, já que, uma vez que eu aceite usar drogas novamente, caminharei ao lado dele?

E você, tem feito o quê?

Só por hoje!


Nenhum comentário:

Postar um comentário